sábado, 29 de setembro de 2012

Capitulo 2: Djinns and Dragons - Parte 3 - FINAL

Intermission: Dionathan


Fechei a porta atrás de mim e sentei na escadaria que dava diretamente no supermercado.

Acabo de escapar de uma bela bronca, e ainda evitei o tormento de ser chamado de “Daisy” ou “Margarida. Obrigado, Deuses protetores. Continuem me protegendo da Noilma.

Nessa aeronave, cada aberração possui um nome, mas como reles e nada normais criaturas que não tem o que fazer, concordamos em inventar apelidos uns para os outros.

Não é algo difícil de entender se levar em conta o tédio que encaramos aqui todos os dias.

Sim, o tédio.

Há cerca de uma semana que levantamos vôo de Royal Island. Os Dark Merchants que nos acompanharam a bordo da Izanagi abandonaram o veículo três dias atrás. E desde então, nossas festas cessaram e caímos em um limbo de monotonia.

Mark disse que estávamos próximos a um continente que lhes interessava, então saltaram de paraquedas enquanto deixavam para trás alguns mantimentos. Eles provavelmente caíram no oceano, portanto tudo bem. Afinal, devem ter alguma bóia no meio daquelas mercadorias... Eu espero.

Maldição, por que só pensei nisso agora?! Por que diabos eles teriam uma bóia com eles?!

Talvez  porque fossem Dark Merchants. É, faz sentido. Eles não pulariam se não tivessem... Eu preciso parar de pensar nisso.

Suspirei.

Acho que estou fazendo inúmeras expressões estranhas enquanto reflito, mas tudo bem. Não há mais ninguém aqui.

Bom, isso não pode ser ajudado. Eu tenho certeza de que eles estão bem... Gostaria de ter deixado todos em um lugar melhor, mas não controlamos a Izanagi. É ela quem decide nossa trajetória e destino. Ela meramente segue seu próprio rumo e pára onde quiser.

Por sinal, há um leme no final do corredor três neste andar, na seção das guloseimas, mas como ele não funciona, ninguém se importa, e assim acabamos gerando uma espécie de vítima de exclusão social, ignorando-o sempre que podemos.

Este é um belo passatempo por aqui. Ignorar as coisas. Embora sejamos talentosos nisso, ninguém é capaz de ignorar ameaças vindas de uma fujoshi.

Sinto que a cada dia que passa, perdemos lentamente nossa sanidade. Precisamos de mais pessoas normais por aqui, ou passatempos, ou pelo menos passar mais tempo longe dessa ilha voadora.

Olha, legal. Um saco de arroz saltitante!

- Olá saco de arroz saltitante!

Certo, eu acabei de me comunicar com um saco de arroz... Que está pulando incansavelmente na minha frente? E que diabos é isso?

- Ei... Ei, saco de arroz-san... Você ta bem?

Ele se jogou da escada e caiu, degrau por degrau, rolando de seu próprio jeito.

- Você quer que eu te siga?

Depois de cair do ultimo degrau, ele se ergueu e acenou positivamente.

Bom, por mais idiota que isso possa parecer, por mais senso comum que eu possa ter... Não posso ignorar um arroz saltitante. É simplesmente excêntrico. Tem um certo grau psicológico de identificação envolvida nesse processo. Então... aye, vamos seguir o saco-de-arroz-san!

Mas para onde você está indo? Sinto que perguntar não vai me trazer muitas respostas, mas alguém precisa contribuir pro suspense da trama. Ei, este é o corredor de ingredient- O QUE?!

Ele está... Vazio...
Pacotes espalhados para todos os cantos e... Arroz. Arroz, por todo o lugar!

- Droga, eu sinto muito... – caí de joelhos perante o pacote de arroz que me trouxe – eu não pude protegê-los como deveria... Minha lâmina não foi forte o suficiente. – me curvei perante a ele em sinal de arrependimento. – Eu sinto pela minha fraqueza...

Isso é tudo culpa da Noilma e do Ciro.

De vez em quando os dois assumem o meu posto de cozinheiro desta espelunca. Seja para me dar uma folga, ou porque um lado obscuro e oculto de minha alma vem à tona e luta contra tudo e todos na tentativa de obter um bocado a mais de almoço

É, eu sou um desses personagens que tem espírito no corpo. Não, não adianta benzer, eu já tentei. Essa coisa simplesmente me domina e me faz querer comer as coisas quando a fome bate, então é como se eu vivesse em um eterno dilema em que cozinho e escondo a comida de mim mesmo.

Mas... Como se não bastasse os dois queimarem um fogão semanalmente – o que exigia assaltos massivos às lojas de eletrodomésticos – eles ainda não calculam as quantidades a serem servidas.  Pessoas que levam este tipo de filosofia de vida merecem a morte.

Não, eu não sou pão duro. Pare de pensar isso!

Eu sei que parte da culpa é minha por ter comido exageradamente na hora, mas isso só faz eles serem ainda mais culpados por não terem me detido!

O saco de arroz que me encarava... Ou que parecia me encarar, finalmente se aproximou e acariciou minha cabeça. Acho que isso é algum tipo de sinal de perdão, fico feliz.

LIKE HELL!

Levantei e chutei o saco de arroz com tudo o que tinha para longe.

- Eu não vou cair nesse truque mais uma vez!

- Mano, deixa de ser chato. Não da pra cair como na primeira vez?

Ela apareceu. Flutuando na minha frente, uma garota baixinha e asiática com uma fumaça vermelha exalando de suas pernas.

Efeitos especiais bem legais, mas você não pode enganar o grande líder-samurai que tem a percepção mais aguçada do que a própria lâmina da espada! Boa, essa frase foi maneira.

- “Mano”? “MANO”?! Onde neste planeta uma Djinn fala dessa forma?

- Ei, qual é o preconceito? Nós também usamos gírias.

- Dildo! Pelo visto você achou ela. – Andrew vinha correndo do andar de baixo para me salvar daquela situação inconveniente.

Recomendo que os desinformados NÃO PROCUREM saber o significado desse apelido.

Andrew é mais uma espécie perfeita de aberração que citei mais cedo.

Por que todos têm que inventar nomes tão constrangedores?! Não basta o nome? Eu sou o fundador deste grupo. Eu não ligo se discordarem disto, mas pelo menos tenham certo grau de noção de hierarquia e entendam a situação quando eu proibi-la em algum futuro distante!

- Andy. Por que a nanica estava perambulando sozinha pela Izanagi?

- It’s not my fault... – suspira - Ela simplesmente escapou. É difícil segurar fumaça... Se é que me entende.

Que ser complicado fomos arranjar... Isso explica toda a polêmica por trás do preço de um Kinder Ovo. Mas ainda assim acho que deveria ser mais barato.

- Eu não preciso de uma babá, ainda mais se for ele! – retrucou. – Eu sei me virar sozinha.

- É só até conseguirmos te chutar daqui, não esquenta. – acalmei a Djinn.

Estou sendo encarado com desprezo.

Droga, nós somos os melhores em conquistarmos o desprezo de alguém.

- Certo, certo. Parece que não vamos conseguir te prender no andar de jogos, e acho que Djinns não precisem se alimentar, não é?

Ela nada disse, apenas continuou ouvindo o que eu dizia como se eu fosse apresentar alguma solução eficiente. Mas não vou.

– Sério, isso tudo não estaria acontecendo se o Rodrigo tivesse me dado a granada de aprisionamento que estava guardada no armazém lá na cobertura. Mas ao invés, ele me da uma bala de borracha na cara.

ARRRRRRGH! De onde diabo veio toda essa água fria? Espera, desde quando temos um balde flutuante no teto? Ah... Sim... Entendo.

- Acho que nossos gênios não batem. Gênios, entenderam? Haha. – Tremi de frio e me encolhi.

- Espero que aprenda.

- Não me faça explodir com você.

- Ei, parem com isso. Se vocês quebrarem alguma coisa a culpa vai cair em mim também. E por falar em explodir...

Engoli seco.

É agora.

Adeus a todos. Foi uma boa aventura enquanto durou, por mais monótona que tenha sido seu final.

-Dildo, eu te entreguei algumas granadas na semana passada, não foi?

- UM CAVALO! NÃO, UM PINGUIN! Não, um cavalo-pinguin surgiu na ilha em que descemos e precisei usar! Sim, todas, todas elas!

- Understood.

Entenda você também; isso não era lá uma desculpa estranha neste planeta.

- De toda forma, eu sabia que isso aconteceria, mesmo pedindo para você apenas guardá-las para mim. É bom saber que você serve para testes deste tipo.

Cretino, então eu me remoí tentando esconder isso de você por sete dias à toa? E ainda por cima, era um teste?! Já pensou se elas funcionam de uma maneira errada? Eu podia ter me explodido junto!

Mas conhecendo ele, é bem provável que a intenção tenha sido essa.

- Dá para fazerem os três pedidos depressa?

- Por que tão rápido? – Andrew assumiu o interrogatório.

Sentei em um caixote vazio que estava próximo a uma prateleira e fiquei a ouvir.

- Hã? Para me tornar humana novamente, é lógico! Depois de realizar os seus três desejos eu finalmente vou poder me libertar daquela mini-lâmpada dourada e poder andar por aí, livre com todas as amigas que farei! E então viajaremos pelos céus em uma aeronave! E... E...

- Olha, não adianta apressar. – interrompi – não podemos tomar esse tipo de decisão assim. Precisamos conversar com os outros membros do grupo. São só três desejos, afinal.

- Então vá conversar com eles!

Olhei para as escadas pelas quais desci. Eles ainda estavam lá em cima, provavelmente ouvindo da Noilma.

- É melhor não... – estremeci.

Algo me diz que não foi o frio.

Quando você dá motivos para uma mulher te castigar verbalmente, elas não param. Sinto pena daqueles dois.

- E se eu desejar você de boca calada?

- ...

- Congratulations, Dildo. Um pedido a menos.

- Mas... Mas eu não... AHHHH, MAS QUE DROGA! Volte a falar!

- Agora você só tem mais um desejo. – ela sorriu.

- O QUE?!

- Por favor... Fique calado, Dio.

Eu abaixei a cabeça e respirei fundo.

Não estou pensando direito. Deve ser por causa de tanta chatice acumulada.

- Sinto muito, é tédio acumulado.

- Eu entendo bem, eu queria que esse lugar fosse diferente.

Paramos.

Nos entreolhamos.

Começamos a suar frio. Já era.

A garota sorriu, e dançando feito uma cigana, realizou a sua façanha; tudo tremia.

As prateleiras ameaçavam tombar, mas não importava, porque uma por uma, elas se quebravam em pedaços, e então viravam farelos, e iam se reduzindo até desaparecerem. O mesmo aconteceu com os outros itens, até a sala ficar vazia.

Mas os tremores não cessaram. Eu me segurei à parede, Andrew se pôs no chão protegendo a cabeça.

Quanta poeira caindo do teto. Por que nunca faxinamos isso daqui? Mesmo tendo uma garota no grupo... Qual o nosso problema?

Se bem que teias de aranha e poeira tem lá seu charme. É, esqueça a limpeza.

E então, as paredes começaram a se curvar, simplesmente entortaram, e o gigante andar que antes era um retângulo se tornou um círculo.

Na extremidade sul, a parede se tornou de vidro permitindo observar a ilha toda e o horizonte. Então, surgiu uma porta nessa vidraça e o chão se estendeu a sua frente. Um posto de vigilância. Uma verdadeira varanda em formato de triangulo retângulo cuja base se conectava com o andar e a ponta se virava para o sul da ilha.

Ao norte, cercando dos dois lados as escadas que subiam para a cobertura, surgiram duas lanchonetes extensas, mas aparentemente eram a mesma porque partilhavam do mesmo nome. “Bar Sashiburi”

E então, na frente dele, algumas cadeiras e mesas se ergueram com alguns vasos decorativos fechando a área para lanche.

A parede leste se tornou completamente coberta por uma Tv de incontáveis polegadas. Decorações como quadros, fliperamas, e outras coisas surgiam na parede a oeste.

No centro, uma espécie de globo semi-circular surgiu. Estampada em sua face, um mapa do mundo com os continentes até então descobertos. Era possível girá-lo e em caso de necessidade, também daria para acrescentarmos informações e desenhos.

E a nordeste deste globo, um grupo de sofás surgiu, formando um quadrado. Perfeito para cochilos.

O teto foi revestido por um papel de parede que representava o céu noturno, onde as estrelas brilhavam como se fossem verdadeiras. 3D é um termo muito fraco para dar natureza a realidade do que estava representado ali.

A escada que levava até a cobertura se ramificou em três, e o teto que ficava a uma distancia considerável do chão, descera um bocado. Não era incômodo, mas passava a sensação de que um novo andar surgia sobre nossas cabeças.

E então, os tremores pararam. Tudo estava calmo... E limpo. Eu e Andy nos levantamos. Nós gastamos todos os três pedidos de uma Djinn com coisas totalmente desnecessárias e inúteis...

Tudo bem que este último pedido valeu um bocado a pena porque... Wow. Mas Rodrigo vai nos matar.

- Certo, Andy. Todos vimos que a culpa foi inteiramente sua.

- Você tem 2/3 mais culpa do que eu.

- Não sei do que você está falando. Eu não fiz pedido algum e você não pode provar o contrário.

- Bom, ela pode testemunhar a favor da verdade. – apontou para a garota.

Eu tinha me esquecido dela até agora.

E para nossa infelicidade, o dano era irreversível; ela não estava mais flutuando, mas sim correndo com as próprias pernas pelo andar, feliz.

Não era mais uma Djinn, mas uma humana.

- Finalmente, finalmente! Eu sabia que algum dia um idiota surgiria para me ajudar!

Ei, estamos bem aqui, você sabe disso, não sabe? Melhor segurar a raiva e fazer de conta que não ouvi.

- E o que são aquelas escadas?

- Elas levam para os dormitórios! A da esquerda é o masculino e a da direita leva ao feminino.

E dragões? Amigas imaginárias? Será que ela sabe que temos estes tipos de criaturas a bordo? Francamente... Mais casos de exclusão social dentro dessa aeronave?

- Mas nós não pedimos por isso. – Andrew.

- Considerem um presente. Me senti mal por vocês terem feito só um pedido descente.

Entendo. Nós também sentimos pena de nós mesmos, acredite. Mas independente disso...

Eu corri, pulei em um dos sofás, e depois para a praça de alimentação me aproximando do Bar Sashiburi do Oeste.

Sim, porque eles precisam de nomenclaturas para se diferenciarem.

Olhei para trás e vi Andrew analisando os outros objetos que surgiram, provavelmente procura algo de seu interesse. A ex-Djinn já estava caída em algum canto. Acho que estava cochilando.

Deve ser fácil se acostumar a dormir tão facilmente depois de passar algum tempo dentro de uma mini-lâmpada.

Me voltei mais uma vez para o Sashiburi do Oeste.

Entre eu e seu interior, o balcão e as banquetas. Estava todo equipado. Frigideiras, facas, copos. Em seu interior, um alçapão.

Com uma pequena investigação, foi fácil descobrir que aquela entrada no chão conduzia a um estoque de alimentos. Mas curiosamente, dentro daquele local, havia uma escada de frente para a qual desci que desembocava no Bar Sashiburi do Leste.

Então eles eram interligados. Agora as coisas fazem mais sentido... Embora desnecessárias.

Subi as escadas e saí do Sashiburi do Leste. E quase que simultaneamente, Rodrigo, Ciro, e Noilma desciam. Pareciam tranqüilos. Aparentemente, a mágica apenas afetou este andar, e nada ocorreu nos superiores ou inferiores, nem um único tremor.

Mas toda aquela calma sumiu em um instante.

- QUE LUGAR É ESSE?  

Espera, quem é aquela atrás deles?!

- Cuidado!  - fiz uma espada levitar apontando para a garota que surgiu de trás do Rodrigo.

- Intrusa! – Ao mesmo tempo, Rodrigo sacou suas pistolas e Ciro pegou em sua lança, apontando para a garota de olhos levemente puxados que dormia.

Ficamos nos encarando por um tempo, até que Noilma explicou toda a situação. Quem era Heike, o que era. Falou também sobre a Djinn.

Poupando nossos leitores, aproveitei e também expliquei o que alterou a estrutura da Izanagi:

- E então, a Djinn simplesmente alterou o andar porque seus poderes saíram do controle. Isso fez com que ficasse sem forças e virasse uma humana comum!
Eu não podia dizer a verdade. Andrew me olhava com cara de musgo enquanto eu inventava aquela mentira cabeluda.

Mas o importante é que tudo vai ficar bem. Ninguém vai acusá-la por isso. Yey.

- Então este é o novo supermercado? Legal. – Ciro.

- É uma forma de se ver isso... Eu acho... – Andy suspirou.

- Só que não. – Noilma se sentou em um dos sofás - Mas eu gostei do novo visual. É bem completo, também. Tem um pouco de tudo.

- Mas ainda é estranho. Pelo que ouvi, Djinns geralmente concedem três desejos.

- Ela deve ter gastado com outro alguém.

Obrigado por essa resposta Ciro. Você acaba de me poupar de mais uma fantasia mirabolante.

E então, Heike voltou ao normal. Isso era inédito para quase todos. Já sabíamos que ela era um dragão, mas nunca presenciamos sua transformação.

Passamos mais um tempo conversando e discutindo as vantagens que teríamos, e também as desvantagens mínimas que aquilo tudo traria. 
Mas não importa como você encare a situação, hora ou outra vamos ter de encarar aquilo...

Os Andares Proíbidos. Não podemos adiar isso para sempre...

... Mas podemos por hoje.

O sol estava se pondo. Com a ajuda de Heike, Noilma trouxe a garota de traços orientais para a varanda onde observávamos o céu.

Não sei qual a altitude que alcançamos, mas sei que essa paisagem é exatamente como um dos quadros românticos que sempre observamos em exposições de arte.

E lentamente, o alaranjado ia se tornando avermelhado a medida que o sol se abaixava no horizonte. Continuávamos conversando, bebendo suco de laranja que fora feito por mim com a ajuda de Ciro e Noilma.

Meu preferido. Com a mesma cor do poente.

À medida que nossas risadas ecoavam pelos céus e comemorávamos o nascimento de uma nova QG, um grupo de pássaros enormes de cor branca decidiu nos ultrapassar voando em direção ao horizonte e seu deslumbrante pôr-do-sol.

= Ending =

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