segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Capítulo 6 - The Dead Remains of a Necromancer's Past - Parte 1

Opening: 
When You're Gone - Mary Elizabeth McGlynn / Trilha sonora de Silent Hill: Shattered Memories



Intermission: Lenarth

Quando foi que eu comecei a me interessar por magia mesmo? Quando me perguntam sobre isso, eu respondo que é por causa dos manticoras que vivem nessa ilha. 

Como sempre gosto de lembrar, todos os animais capazes de se reproduzirem nesse mundo podem usar algum tipo de magia naturalmente. Seus corpos são feitos para se adaptar a essa magia. Alguns cientistas recentemente descobriram que essa capacidade mágica está ligada à própria genética desses animais. Como resultado, magias se desenvolvem em animais a uma base de "dominante - recessivo". Algumas espécies, como dragões, possuem várias habilidades mágicas. Seus filhotes portanto irão herdar a habilidade de um dos pais. Novamente, o gene dominante superará o recessivo e o dragão nascerá com a habilidade carregada de seu código genético. 

Já manticoras são um pouco diferente. Todas as espécies possuem as mesmas habilidades mágicas: voar, e invocar ataques de fogo pela boca (provavelmente porque a seleção genética decidiu que uma cauda em forma de agulha capaz de injetar um veneno capaz de matar um humano adulto e saudável em  menos de um segundo não era uma vantagem grande o suficiente). 

Mas quanto a humanos, não é tão simples assim. Humanos não possuem esses genes que carregam informação sobre capacidade mágica. E como humanos não se reproduzem, não podemos saber se existiria alguma relação genética. Sinceramente, parece que nossa tendência mágica é completamente aleatória. Então a minha tendência ser para necromancia, foi apenas meu azar. Bom, muitos humanos vivem suas vidas sem jamais se aproximar de magia. Isso é bem comum na minha ilha. Mas por algum motivo eu queria aprender. 

Eu podia tentar aprender algo fora da minha tendência. Isso é possível para humanos por alguma razão, mas nossas habilidades jamais se comparariam as de alguém que treina dentro de sua tendência, mesmo que a mesma quantidade de esforço e paixão seja colocada. 

Agora que penso nisso, a razão pela qual eu quis aprender magia, pode ter sido na verdade apenas minha vontade de fazer algo que só eu poderia fazer. Sim, ser o melhor em algo. Ser admirado por uma habilidade específica. Nada tão grandioso quanto "querer entender melhor os animais dessa ilha". Sim, eu só queria ser o melhor em algo. Queria evoluir em uma direção que ninguém poderia me alcançar. Usar necromancia para ajudar os animais mortos nessa ilha também pode ser ligado a esse desejo. Já que nenhum outro necromante (não que eu tenha conhecido ou ouvido falar) tenha seguido um caminho assim.

Então o que fazer para continuar minha evolução? Esbarrei nessa pergunta quando percebi que não havia mais espaço para melhorar o que estou fazendo. Animais são simples. Mesmo que eles tenham ressentimentos ao morrer, eles aceitarão seu destino, aceitarão o processo natural do qual fazem parte. Eu apenas dou um empurrão. O próximo passo talvez seria aconselhar os humanos mortos que não conseguem largar de seus ressentimentos. Mas não é como se pessoas morressem diariamente nessa ilha. Não, eu não gosto nem de pensar nisso. Eu amo as pessoas dessa ilha.

Isso significa que para evoluir, eu precisaria viajar novamente. Simples assim. Sair em uma nova jornada. Voltar a esconder meus poderes em troca de uma nova chance para evoluir e também conhecer novas pessoas…

— Você não deve deixar a ilha.

Essa voz não existe. É algo que está apenas em minha mente. Isso não é real. Mas por que continuo ouvindo isso toda vez que penso em deixar a ilha? Por que essa voz se torna quase dolorosa toda vez que olho para os navios de viagem no porto? E por que… por que eu não quero ir em bora?

Querer evoluir deveria ser minha real motivação. Mas algo me prende aqui. Não, não posso simplesmente jogar a culpa em "algo". Eu provavelmente não quero sair, por algum motivo que eu mesmo não entendo. É culpa minha, mas como eu faço para superar isso?



Intermission: Rodrigo

Eu estou doente.

Merda!

Como isso foi acontecer? Eu sou um idiota. Idiotas não ficam doentes! Ou não ficam gripados… droga, será que a única proteção que eu tenho é contra gripe? Porcaria. 

De qualquer forma, boa parte do grupo saiu para buscar suprimentos em uma ilha que nos aproximamos. Por algum motivo a Heike também foi… bom, parece uma ilha pacífica então eles não devem demorar nem correr nenhum perigo.

Mas toda vez que olho para a ilha pela janela de nosso QG, sinto que há algo estranho.

— Rodrigo, você não deveria estar no seu quarto descansando?

Noilma apareceu do nada.

— Descansar é para os fracos, se eu me deitar e ficar agonizando na cama essa doença fará o que quiser comigo! Preciso mostrar a ela que ela não tem poder suficiente para me derrubar! Então ela acabará fugindo por puro medo!

— Não, não funciona dessa forma.

— Tsc, whatever, apenas me deixe suar um pouco e eu ficarei bem logo.

— O que você quiser.

— Ei, você não tinha dito que queria sair um pouco? Achei que você iria com eles dessa vez.

— Verdade, mas a Lucie quis ir e acabei deixando já que ela estava tão focada no trabalho ultimamente que não teve tempo de sair a algum tempo.

— Entendo… Quem é Lucie mesmo?… Ah, esqueça. Lembrei. Hell, como você conseguiu lembrar dela tão rápido?

— Porque você me fez uma pergunta referente a ela, então a memória veio instantaneamente, e diferente de você eu não sou idiota.

Ela tem um ponto, mas isso me preocupa um pouco.

— Espero que eles não acabem esquecendo ela na hora de voltar.

— Não se preocupe, a Heike foi justamente por isso. Ela tem alguma facilidade em lembrar da Lucie. Outro dia ela me disse que não é afetada pela maldição dela quando está em forma de dragão.

— Então o efeito é só em humanos? Interessante… ow hell, devo anotar isso.

— Não se preocupe, já fiz isso. Bom, mas por precaução eu também dei a Heike um bracelete com o nome da Lucie. Ela deve se lembrar dela assim que ver o bracelete mesmo que esteja distraída.

Essa é a Noilma. Sempre um passo a frente.

Parece que nossa conversa terminou então voltei a encarar o oceano pelas janela. Mais especificamente a ilha. É difícil ver o que está imediatamente a baixo de nós, já que as bordas da Izanagi se estendem mais longe do que nosso observatório pode cobrir. Mas ainda estamos a certa distância da ilha, a Izanagi não se move exatamente rápido quando estamos sobre o oceano então deve demorar um dia inteiro ainda para que a ilha esteja completamente fora de vista. Talvez a Izanagi goste do mar?…

É um péssimo hábito esse de me referir a essa ilha como se fosse uma pessoa. Bem, o Dionathan também faz isso de tempos em tempos então posso jogar a culpa toda nele e fingir que não é meu problema.

Mas não consigo me livrar desse sentimento estranho…

Se a Izanagi realmente fosse uma pessoa, sinto como se nesse momento ela estaria me dizendo: "Não se aproxime daquela ilha."



Intermission: Heike

Estou entediada. Seriamente entediada. Super duper entediada! Se o Rodrigo ouvisse isso, ele provavelmente faria uma retórica sobre como a palavra "duper" não existe. Sentir falta dos tsukkomis dele apenas prova o quão entediada eu estou. Lenarth conhece essa floresta muito bem, bem de mais! Nós não passamos por nenhum lugar perigoso e não aconteceu absolutamente NADA desde que nos separamos dos outros. Estou quase pedindo para ele propositalmente entrar em uma área perigosa apenas para ter algo mais emocionante. Eu sei que isso é irracional, mas o tédio vai me matar!

Como estou entediada, e quase indo atacar aquele grupo de manticoras ali perto só para me entreter um pouco (embora isso talvez seja meu instinto de dragão procurando por comida, por algum motivo eles parecem apetitosos… não, não, eu jurei ser herbívora! Desde ontem pelo menos… pelo menos até o fim dessa semana…), tenho todo o direito de fazer perguntas intrusivas para o Lenarth enquanto caminhamos, certo? Para quem eu estou perguntando? Não importa!

— Lenarth, você é casado?

Ah, ele tropeçou.

— De onde veio essa pergunta? Eu pareço casado?

— Bom, você não usa uma aliança… mas como os costumes aqui da ilha são diferentes, achei que isso não era o bastante para dizer.

— Não, não sou.

Ele se levantou e tirou a poeira das roupas antes de continuar andando. Ele parece meio irritado? Será que toquei em um assunto que não devia?… Nah, tenho certeza que não é isso.

— Então, você gosta de animais, certo?

— Fazer essa pergunta logo depois de me perguntar sobre casamento faz isso soar tão mal.

— Isso significa que você não é zoófilo?

Ah, ele tropeçou de novo.

— ESCUTA AQUI! O QUE VOCÊ PENSA QUE EU SOU?!!!

Dessa vez ele se levantou mais rápido, mas não vejo o porquê dessa reação exagerada.

— É que você parecia ter um apego anormal àquela manticora. Apesar de que eu estava distraída e não cheguei a reparar se era fêmea ou macho.

— ISSO NÃO É IMPORTANTE!

Ele suspirou e balançou a cabeça. Wow, essa reação foi idêntica a algo que o Rodrigo faria.

— É verdade que eu me preocupo com animais — ele se acalmou e voltou a andar — mas não da forma como você está pensando!

— Então você não tem ninguém de quem goste?

— POR QUE VOCÊ ESTÁ TÃO INTERESSADA NISSO??!!

— Humm, é que é a minha primeira vez conversando com alguém de fora da Izanagi. E a única pessoa que fala desse tipo de coisa comigo é a Yuu. Todos os outros parecem não se importar com relações amorosas, e eu li em um dos livros da Lucie que isso era algo importante. Então fico preocupada, talvez eles estejam todos doentes de alguma forma.

Outro suspiro dele.

— Escute, não sei os detalhes. Mas sinto que isso é algo difícil para você perguntar a eles tão diretamente, então vou falar o que eu acho. As vezes você têm coisas mais importantes em mente, ou simplesmente têm outras prioridades. Talvez eles estejam abrindo mão disso para lidar com outras coisas. Tenho certeza que seu grupo tem grandes objetivos. Não é como se eles não se importassem, eles provavelmente tem outras coisas em mente…

Achei que ele fosse dizer mais alguma coisa, mas ele parou de falar e apenas continuou andando. Humm, acho que entendo um pouco melhor a forma de pensar dele agora.

— Você se parece muito com o Rodrigo.

— Eu imploro, tente manter algum contexto.

— Ah, isso é algo que ele diria. Mas como posso dizer, a forma de pensar de vocês, até a atmosfera ao redor de vocês são quase idênticas. Na verdade é tão parecido que quase acho que não é apenas coincidência.

— Esse Rodrigo, é um de seus amigos?

— Sim, o que ficou para trás por estar doente.

— Entendo…

— Então, você teve alguma relação com ele no passado?

Ah, ele tropeçou mais uma vez… acho que estou começando a gostar dessa reação. Admito que só falei isso para ver ele tropeçar de novo. Acho que estou virando uma sadista. Desculpe Rodrigo, eu sei que você me disse para nunca virar uma.

— VOCÊ NÃO SE CANSA NÃO?!

— Haha, calma, foi só uma piada.

Ok, acho que isso foi divertido por hora. Voltamos a caminhar em silêncio por um tempo… ah, tédio. Ok, até eu tenho senso de que só estaria incomodando ele se puxar outro assunto aleatório. Ok, vamos observá-lo um pouco. Hmmm, ele parece ter uma expressão séria o tempo todo e quando estava gritando a expressão dele virou uma mistura de raiva, com a boca distorcida em um sorriso largo porém torto. Hummm, ok, a partir de hoje, nomearei você como Rodrigo 2: Return! Ah, não sei se posso por números e caracteres especiais em nomes. Então será Rodrigo Dois Return! Sim, isso parece mais com um nome. Mas "Return" é clichê, algo com mais impacto… Ah! Rodrigo Two Payback! Perfeito! Não posso evitar, eles são parecidos de mais! Sério, o Rodrigo deveria estar aqui para ver isso. Seria como ver um espelho mental. Que azar ele ficar doente justo nessa situação…

— Sabe…

Ele parou de caminhar assim que comecei a falar. Tsc, parece que ele está prevenindo outro encontro com o chão.

— Tem outro aspecto que você lembra o Rodrigo…

— Como assim?

— Humm, não sei se devo dizer isso…

— Não tente se fazer de modesta agora, não vai funcionar.

Suas palavras me machucam, sabia?

— Bom… isso não é só o Rodrigo, talvez o Dionathan também, e o Ciro um pouco… Talvez até o Ryu…

Ele parece confuso. Acho que devo explicar mais.

— Como se vocês estivessem parados no tempo.

Ele arregalou os olhos.

— Como se tivesse algo prendendo vocês… por algum motivo, vocês não conseguem mudar. Permanecem as mesmas pessoas. Como se estivessem sempre ligados a algo do passado que já não existe mais…

A expressão dele congelou. Acho que fui longe de mais… sim, eu tenho esse tipo de sensibilidade… mas isso é importante se conseguir falar com ele sobre isso, talvez eu consiga uma pista de como ajudar o Rodrigo e os outros. Eu sei que eles carregam algo, e passando tanto tempo com eles, posso ver claramente isso no Lenarth também. Mas quando tentei falar disso com o Rodrigo, ele simplesmente sorriu e disse "É apenas sua imaginação, não se preocupe."

— Acho que você está imaginando coisas, não se preocupe com isso, tenho certeza que seus amigos estão bem também.

Sim, eles fogem dessa pergunta da mesma forma.



Intermission: Lenarth

De alguma forma, essa garota é extremamente perceptiva. Apesar de ser terrivelmente insensível quanto algumas coisas. Droga, de onde vieram todas aquelas perguntas?

Bom, não importa.

Algo me prendendo ao meu passado, hein…

Nunca tinha pensado sobre isso, mas faz muito sentido de alguma forma. No momento em que ela falou disso, senti como se tivesse me tornado completamente transparente. Ela está certa, ainda não entendo como, mas isso parece certo. Por algum motivo, meu passado não me deixa sair da ilha. Mas por quê? Não acho que eu tenha algo inacabado… Também não lembro de estar devendo algo a alguém. Talvez não lembrar seja o problema aqui?

De qualquer forma, estamos nos aproximando da vila. Descobri um dos anciões descansando perto de um estaleiro.

— Senhor Hubrigs! — chamei.

— Lenarth?

Corri até ele, Heike também acelerou o passo.

— Vejo que está acompanhado de alguém que não é daqui. É para ela que estão preparando todos aqueles mantimentos?

— Sim.

— Obrigada por nos tratar tão bem — inesperadamente, Heike se curvou e agradeceu.

— Ela parece ser uma garota educada. É um prazer dividir nossos recursos com pessoas de boa índole, não se preocupe.

— Senhor, — gostaria de apresentá-los direito, mas temos outras prioridades — alguns dos visitantes se perderam na floresta quando fomos atacados. Parece que eles não são os únicos nessa ilha. A floresta está cheia de armadilhas.

— Já entendi aonde você quer chegar. Reúna os mais jovens, os meus filhos devem estar ajudando na plantação, eles te ajudarão a reunir todos os que podem ajudar na busca.

— Muito obrigado.

— Muito obrigada — gostaria que ela também mostrasse esse respeito comigo.

Eu e Heike fomos em direção as plantações, avisando todos sobre a situação no caminho. Como esperado, a cidade rapidamente começou a se organizar. A maior parte dos jovens estão nas plantações por causa do meu pedido, mesmo com o anoitecer estando tão próximo. Precisaremos de lanternas, já está começando a escurecer.

De repente, deixei de ouvir os passos da Heike. Bom, não é como se eu pudesse ouvir muita coisa para começo de conversa, mesmo quando ela não está se preocupando com isso, os passos dela são incrivelmente silenciosos, mas me virei para trás.

— Algum problema?

— Não… não é nada…

— Você pode esperar na praça se não estiver se sentindo bem. O som da água da fonte lhe ajudará a se sentir melhor. E todos irão se encontrar lá em meia hora antes de sairmos para a busca. Você não precisa se forçar a vir comigo.

— Hum… certo, obrigada.

— Você sabe onde fica?

— Sim, acabamos de passar por lá.

— Ok, então vou indo na frente. Tente ficar melhor logo.

Dizendo isso me afastei dela. Será um problema se ela não estiver bem para ajudar nas buscas, mas também não quero pressioná-la. Enfim…

***

Quarenta minutos depois, já está bem escuro, todos os homens jovens da ilha estão ao redor da fonte segurando lanternas à óleo. Heike parece estar um pouco melhor e veio em minha direção assim que cheguei. Expliquei os detalhes a todos que se reuniram e nos dividimos em grupos de três para as buscas. Não temos magias de comunicação na ilha, então na floresta usaremos assovios com folhas para nos comunicarmos. Pode parecer primitivo, mas é eficiente, e ajuda a espantar os animais. Já que poucos tem hábitos noturnos, a maioria preferirá fugir ao ouvir os assovios. Em outros dez minutos já estamos todos de partida.

— Tem certeza que não quer ficar? — perguntei a Heike.

— Não, estou bem…

— …Certo, então vamos nessa.

Olhei para Lohan ao meu lado, ele é o terceiro membro do nosso grupo e com um simples gesto confirmamos nossa ida.



Intermission: Heike

Por algum motivo… todas as pessoas da ilha tem um ar estranho ao redor delas. Não… não estranho… é bem familiar na verdade. Sim, é como estar perto da Yuu.

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