quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Capítulo 6 - The Dead Remains of a Necromancer's Past - Parte 2


Intermission: Dionathan

O esqueleto parou de falar. Ainda da pra ouvir sua gargalhada ecoando nesse vazio preenchido com cadáveres. Fora isso, apenas o som de madeira se queimando em algum ponto distante.


Eu não sei onde estou, nem mesmo como cheguei aqui. Mas aqui estamos, com uma katana na nuca de um monte de ossos que ri e conversa. Eu não deveria fraquejar em uma hora destas, mas definitivamente, eu não devo mais matar ninguém. Merda, essa coisa não deve ser considerada nem mesmo um ser vivo!


- Você...


Ele girou seu pescoço lentamente, direcionando suas órbitas para minha face. Seus ossos e junções estalavam em diversos pontos enquanto sua tremedeira levava à queda de poeira que estava acumulada sobre os ossos.


-... Prometeu, lembra?


Eu me afastei alguns passos. Eu... Prometi? O que foi que eu prometi?


- Você... Matou...


Não. Do que você está falando? Não, não se levan... Minha perna, minha perna está presa! Eu não consigo ver o que a prende. Tem muita fumaça, não da pra enxergar. Espera aí, o que é isso?!

Cambaleei para trás assim que a soltei. Estava presa nas mãos de um dos cadáveres largados no chão.

- Você, não deixaria... A gente morrer...


Calem a boca!

Os corpos ao redor começaram a se mover da forma que podiam. Dilacerados, cortados, desmembrados. Eles estão fazendo um cerco. Isso não é bom.

- É o que restou de você. Do seu passado...


Uma voz fria e ofegante veio de trás. E logo então, uma pessoa com metade do crânio descoberto surgiu em minhas costas.


- ... A morte.


Intermission: Anna

- AHHHH! – Dionathan recuou atordoado.


Eu não sei o que está acontecendo, mas é a hora. É a distração perfeita. Hanged nem sequer percebeu a armadura de gelo se formando ao meu redor.


Armei a bomba da forma mais discreta que pude e a deixei rolar pelo chão. A proteção ao meu redor terminou de se formar. O tempo foi preciso como em meus cálculos. Sua espessura também saiu como o esperado. Não há chances de se romper com o impacto do explosivo.


O tempo se esgotou e a explosão se encarregou de afastá-los de mim.

***

Ilesa, desfiz a camada de gelo que me envolvia. Algo desse tipo não é problema para alguém como eu que pode controlar o gelo. Bom, preciso recuar imediatamente. Hanged, e ainda tem aquele tal do Dionathan... Isso foi inesperado de inúmeras formas. Eu vou precisar de reforços.


Re-ativei minha névoa mágica de forma que voltasse a servir como um manto e me afastei do local.

Intermission: Ciro

Eu relaxei. Não devia ter me distraído. A culpa é toda sua, Dionathan. O que se passou pela sua cabeça? Estava completamente fora de si. Pelo menos não vai se lembrar de ter me visto nessa forma quando acordar. Mas...
Anna deve estar nos arredores. Ainda da tempo de alcançá-la. Fiquei de pé. Não estou muito ferido, mas Dionathan parece estar com o ombro ferido. Ter sido arremessado alguns metros pelo impacto da bomba não deve ter ajudado. Ah, ele vai ficar bem.
Sem mais demora, parti na direção em que eu esperava que Anna estivesse.

Intermission: Dionathan

Ai, ai, ai, ai, ai, ai. O que aconteceu? A droga do meu ombro voltou a doer.  Ah... Parece que eu o desloquei mais ainda. Não brinca!

Levantei e verifiquei o cenário. Este é o lugar onde aterrissamos, não é? Eu me lembro bem desses containers e daquela floresta ali perto. Ah, o navio também está aqui, mas não tem ninguém perto. Ciro deveria estar por aqui... O que será que aconteceu?

Vamos ver. Eu lembro que estava andando em um lugar bem esquisito e de repente eu vi uma caveira e... Bom, não tem ligação nenhuma com o fato de eu ter chegado aqui.

E pensar que eu entrei em transe outra vez. Parece que a dor me despertou. Parece que fui arremessado por um explosivo. Ah, vive acontecendo na Izanagi por causa do Andrew. Mas... De onde teria vindo o explosivo? Bom, faria sentido se fosse outra armadilha.

Mas afinal, pra que tantas delas? O que eles andam caçando por aqui? Manticores?!
É, até que faria sentido. Os moradores devem ser bem cautelosos por aqui.

Mas de todo jeito, é a segunda vez que caio nesse mesmo esquema. Preciso ter mais cuidado daqui pra frente. A ilha parece ter alguma preferência comigo, e acho que sou mais sensível a ela do que os outros. Vai ver ela é realmente como a Izanagi, e de alguma forma acabou gostando de mim.


Naaah, não faz sentido, haha!


Apesar disso, antes de acordar eu estava naquele farol. Não tinha nada de suspeito. Mas ainda não da pra relaxar com o Lenarth e os habitantes. Espero que os outros não tenham problemas.

Bom, está ficando tarde. A névoa já abaixou em sua maioria. Ciro deve ter ido atrás da gente. Os explosivos na estrada até o farol não devem ser problema já que o maníaco sente o cheiro de máquinas e coisas do tipo à distancia.

Só me resta esperar. Sim, logo voltarão. Haha, apenas em alguns minutos... Ou instantes, talvez. No máximo uma ou duas horinhas, mas passa voando. Eu tenho certeza de que já estão voltando com toda a comida e os remédios. Está anoitecendo. Não tem problema se eu dormir por aqui... Sozinho, em um lugar tão abandonado e suspeito. Certo?


***

Desenhei um boneco palito descabelado na árvore com a katana que invoquei. Uma obra de arte que apontava exatamente para a direção que eu decidi seguir. Estou fazendo eles já tem algum tempo, assim evito de me perder e ainda deixo minha marca artística na ilha.
Meu ombro está enfaixado. Não sou bom com assuntos médicos, mas espero que isso alivie as coisas por algum tempo. Até encontrar os outros, pelo menos. Só espero que não tenha que lutar com ninguém...

(...)


Mas que droga, o que é que eu estou dizendo?! 

- VENHAM TODOS ATÉ MIM!, EU OS DESAFIO!!
Certo, uma cigarra começou a cantar. Será isso um sim?

Não posso perder tempo. Já anoiteceu e... Ah, mosquitos. E nem da pra enxergar direito o caminho. A luz da lua não chega com intensidade por causa da copa das árvores. Por que esse tipo de coisa sempre acontece? Nenhuma tocha, sem repelentes. Ok, esse barulho já está enchendo. Vocês já podem me abandonar e procurar algum Manticore aqui por perto.

Vai ver, isso tudo é por eu ter sangue doce. Disse que isso acontece quando comemos muito açúcar. Então vocês gostam disso, heim? Tem certeza que não é porque eu sou um samurai? Nem pelo meu comportamento estranho? Meu visual? Meus monólogos? HÃ?!
- É O CABELO?! – chacoalhei a espada com fervor no ar para todos os lados na tentativa de acertar algum.
Oh, pararam. Há! É o que acontece quando se intrometem com um mestre espadachim, seus insetos!
Há, insetos. Bom trocadilho.
Depois do combate mortal, voltei a caminhar usando a espada como bengala de apoio. Não que eu esteja precisando, mas faz parte do espírito aventureiro de qualquer um. Você não é um verdadeiro viajante se não carregar sua bengala de apoio.
No fim das contas, não devia ter cortado caminho pela floresta. Vou acabar demorando mais que o esperado. E pensar que não coloquei o Ave Maria da Culinária pra gravar...
Não, não há problema. Ainda tem a reprise. E vai ficar tudo certo se eu seguir para o norte. Ou pelo menos em frente... Uma hora isso daqui acaba...

(...)


Ei, o mar? Não devia ter uma cidade ali?

Tudo bem, talvez eu deva seguir pro Nordeste. Se eu continuar seguindo nessa direção eu definitivamente vou achar alguma coisa haha.

(...)

O mar, de novo? É o mesmo de antes, não é?! Não é ilógico? Ah, eu já vi esse boneco palito antes. Isso quer dizer que... Eu fiz uma trajetória circular fechada e não percebi? AHN?!
- Dio, seu idiota. Talvez, se eu conseguir manter a direção sem fazer nenhuma curva ou circulo... Sim, ainda há esperanças! Eu ainda posso chegar até Lenarth e os outros antes do amanhecer! Não é mesmo, árvore-kun? - dei um tapinha em seu tronco – Hahaha, isso, é isso mesmo! Se eu continuar seguindo, definitivamente chegarei a algum lugar.
- Hã? O que é que você está dizendo, Grenny?!
Tem um grupo se aproximando, eles parecem com pressa. São quatro, parecem bem desleixados pela aparência. E olha, eles têm um lampião, quem sabe um inseticida... Ah, eles estão indo muito rápido. É melhor eu começar a correr.

- Nada, esqueça isso e ande mais depressa! Nós precisamos alcançar aquele desgraçado do Lenarth!
Recuei o passo enquanto me ocultava entre as árvores. Lenarth? Ele disse Lenarth, não foi? Inconscientemente, prossegui bisbilhotando a conversa com cautela.
- Já chega, não adianta, ele provavelmente já chegou e...
- Não diga! – O homem que não tinha cabelo o interrompeu - Nós ainda devemos ter algum tempo sobrando... Mais rápido!

Eles apertaram o passo, eu imitei o movimento. É difícil alguém se ocultar nessa velocidade, mas para minha sorte há poucos troncos nessa região da floresta.

Eles parecem realmente desesperados, e estão armados. Pistolas, não são? Parecem ultrapassadas. São bem mais simples do que as do Rodrigo. Acho que tentar me comunicar pode não ser uma idéia interessante... O que Lenarth fez pra ganhar tanta atenção? Eu sabia que havia algo de errado como ele, por isso não estou tão surpreso. Só espero que os outros estejam fora de perigo.

- Eu não acredito que demoramos tanto pra perceber que esse cara era um Necromante... Isso é frustrante! Ele enganou todo mundo!

Hein?

- Não, Lenarth foi cauteloso, ele planejou todos os detalhes. Aquele livro que ele deixou sobre a mesa, e o recado... Ele está zombando da gente.

- Ele já tem tudo sob controle. Não acham que pode ser uma armadilha?

- Ele vai invocar um demônio e você preocupado se é uma armadilha?! Se ele conseguir, a gente morre do mesmo jeito!

- T-Tem razão...

Pouco a pouco, minhas pernas foram perdendo sua velocidade até que eu parasse de persegui-los por completo. Abaixei a cabeça e cerrei os pulsos enquanto as mentiras de Lenarth ecoavam com clareza em minha mente. Então, não passava de teatro. Domador de feras uma ova... Você é só um invocador de demônios, seu desgraçado. Eu sabia que você era furada, mas isso... Droga, isso é passar dos limites.

- Qual o seu problema?! – coloquei a raiva para fora com um grito.

O som ecoou pela floresta. Eu não pensei no que isso acarretaria caso houvesse alguém perigoso nas redondezas. Entretanto, quase que como uma resposta, eu recebi outro grito:

- AHHHHHHHHH!

É aquele Grenny!
Retornei a perseguir a mesma direção colocando todo o esforço possível em minhas pernas. Sem dúvidas, era a voz de um daqueles quatro. Foi um grito único, rasgado e certeiro, um grito de morte. E agora o silêncio, isso não é um bom sinal. É como...

“AHHHHHHH”

Para! Não é hora pra isso acontecer. Aqueles quatro precisam de ajuda, eu preciso alcançá-los.
Minha visão começou a ficar embaçada, ao mesmo tempo, minhas pernas perderam pouco a pouco a capacidade de movimento. Meu corpo já não me obedecia.
E então, o grito dos outros dois que seguiam Grenny. Esperem mais um pouco... Só mais um pouco...

***
O mesmo vazio, o mesmo chão escarlate, a fumaça e os mesmos cadáveres, a mesma madeira queimando. Não, não outra vez! Não vou repetir a mesma cena. Eu não posso perder tempo, ainda existe alguém que precisa de ajuda.

- Apenas se... Entregue... – O mesmo esqueleto. – Deixe que morram. Fique... Fique...

- Cala a boca. Como se eu fosse dar ouvidos a você!

Materializei uma adaga e me ajoelhei. Com as duas mãos em seu cabo, levantei a arma a uma altura superior da minha cabeça.
Eu não posso hesitar, é o único jeito de escapar daqui. Se eu colocar muita força neste movimento eu também vou ferir meu ombro... Mas bom, é a idéia aqui. Sentir dor. Espero que funcione!
Deixei o peso de meu braço cair junto com a arma até que sua lâmina penetrasse na perna sob a qual eu estava ajoelhado.

***

De volta à floresta, eu estava na mesma posição do cenário anterior, com o diferencial que agora havia uma adaga cravada em minha perna, e que a dor dominava meus pensamentos.

- Argh... - Removi a arma e deixei o sangue sair. – Eu quase me esqueci do quanto era doloroso.

Mas pelo menos deu certo.
Isso vai dificultar um pouco a locomoção. Mas tudo bem, acho que estou perto. Há sons de disparos. Provavelmente, está reagindo.
Corri como pude. A ferida doía e me obrigava a mancar, mas não me atrasava muito. Segui o som dos tiros e cheguei ao lugar. O último membro do grupo estava sozinho, apontando sua arma para ninguém.

- Ainda há... Ainda há tempo, Lenarth!! – ele gritou.

Ei, Lenarth não está aí. O que você pensa que está fazendo?
Suas mãos tremiam e havia sangue em seu rosto. Vasculhei os arredores com meus olhos, os corpos de seus companheiros não estavam por perto. E o inimigo também não.

- Fique longe... – seu dedo se movia lentamente contra o gatilho – Se você se aproximar mais eu...

- O que está acontecendo? – me intrometi na cena.

O homem parou e cambaleou para trás deixando sua arma cair no chão. O seu tremer assumiu outro padrão. Ele se virou para mim, e começou a mancar em minha direção enquanto um corte profundo se abria da cabeça ao peito na vertical. Quando ficamos frente a frente, ele deixou que seu corpo caísse em mim. Eu estendi meus braços para segurá-lo, entretanto ele me atravessou e desapareceu por completo.

O que foi... Isso? Uma ilusão? Materializei uma espada comum e procurei desesperadamente por um inimigo nos arredores. Nada. Nem mesmo um invisível. Também não há sangue no chão, nem nos troncos. Não há vestígios de batalha, tudo em perfeito estado inclusive a vegetação. Nem sequer cadáveres.
Não importa o tamanho da batalha que você trave, ela deveria deixar algum vestígio de sua existência, isso está errado. Agachei e conferi a grama e o chão. O mesmo resultado.

- Então foi tudo... Fantasia?

- Você pode ver assim. – uma voz misteriosa me respondeu.

Virei o corpo na direção do sussurro, pronto para atacar.

- É você, Lenarth?!

- Não me rebaixe desse jeito!

Agora a voz veio de outra direção. Adaptei o meu corpo e prossegui tentando enxergar o inimigo.

- Foi você quem matou estes quatro? – continuei o interrogatório.

Apesar do uso do termo “matar”, eu não sei se estou certo. Nem sequer sei o que houve, pra ser exato.

- Se eu fosse o culpado, você acha mesmo que eu te diria? – E rapidamente, ele apareceu em minha frente – Bu!

- Ah! – recuei sem abaixar a arma e fixei meu olhar no alvo – É você!

A mesma criança que eu vi quando cheguei nessa ilha. Então não era só minha cabeça no fim das contas. Mas, como assim? A aparência... Ele realmente parece uma versão minha mais jovem. É idêntico!
Abaixei minha espada por um momento.

- Hahahaha! Você realmente se assustou!

(...)

- Hã? – ele continuou – Você não vai rir também?

- E por que eu riria? Pessoas foram mortas bem aqui, exatamente agora, por que inferno eu teria um motivo para começar a rir?

Ele ficou em silêncio e parou de zombar da situação. No fim das contas era só uma criança, acho que fui duro com ele... Ah, não tenho culpa! Ele já deve estar na idade de entender coisas do tipo.

- Mortas? E como é que alguém mata o que já está...

Pisquei os olhos, e quando eu os abri ele já não estava mais lá.

-... Morto? – Suas pequenas mãos atravessaram meu peito como se fosse fumaça.

Recuei outra vez, isso não é só uma criança. Não é hora pra abaixar a guarda.

- Ah, você não gritou dessa vez.

- O que é você?

- Eu sou a mesma coisa que aqueles quatro que você viu agorinha pouco. Somos energia. Energia espiritual! Soul Energy! Ou se preferir, Anima!

Fiquei imóvel por alguns instantes. Sem dizer nada e também sem saber o que pensar. Animas não deveriam ter esta forma, não é? Deveriam ser apenas energia, seguir em um fluxo, como todas as outras!

- Mas somos diferentes porque somos a energia da vida. Ou talvez da morte. Bom, depende do ponto de vista.

Ele... Acabou de ler meus pensamentos?

- Sim.

- Tudo bem, eu já entendi.

Soltei um suspiro. Vamos racionalizar a situação. Primeiro eu entro em um transe muito doido, daí acordo, tudo estourado. Então eu perco um tempão em uma floresta que eu acho que é um atalho, mas que só atrasou minha vida e complicou tudo. E pra melhorar tudo eu bato de cabeça com Animus? Eu não estou tendo alucinações? Provavelmente é outra ilusão da ilha.

- Eu estou interagindo demais para uma alucinação, não acha?

Faz sentido.

- Você não precisa ter tanto cuidado. Não teria como a gente lutar, eu sou praticamente um fantasma!

É. Animus e fantasmas são basicamente a mesma coisa. O contato físico entre eles e os humanos é algo impossível. Eu estou me protegendo demais. Não preciso ser tão defensivo.
Abaixei minha arma e tentei relaxar um bocado... Se é que é possível em uma circunstância destas.

- Ah, e sobre a minha aparência, não é pessoal. Eu não sou realmente assim, parecido com você. Não, felizmente não, mesmo!

... Ei.

- Eu costumo variar. – ele prosseguiu. – É algo involuntário, mas as poucas pessoas que foram capazes de me ver até hoje se assustaram com isso. Eu não consigo imaginar porque acontece.

Fiquei em silêncio por um momento. É uma situação familiar.  

- Um espelho. – conclui - Você funciona como um espelho.

- E o que tem?

- Nada, é só que... Lembrei de algo que me disseram há muito tempo. É uma lenda. Sobre um jovem que faleceu muito cedo, sem ter o próprio rosto na memória. E então aparecia casualmente, refletindo a alma das outras pessoas em sua aparência.

Ele ficou um pouco cabisbaixo. Acho que toquei em um assunto muito frágil.

- Não, está tudo bem. Parece ser uma boa história! ...Quem te contou?

- Eu não lembro...  É algo que aconteceu há muito tempo.

- Sim. Mas não é por isso que você não lembra.

Saia da minha mente, seu maldito. Já ouviu falar em privacidade?


- Isso não tem importância agora. – cortei o assunto e desfiz minha arma. Não havia mais perigo. – Eu tenho pressa, preciso chegar até a cidade onde Lenarth está e...

- Avisar a todos?!

Não adianta, ele não para de espiar minha cabeça.

- Você viu, não viu? Aqueles quatro eram diferentes, eles viraram ecos de morte. Animus presos em um ciclo de sofrimento sem fim. Eles não descansam em paz, nunca. Lenarth fez aquilo com eles. Eles tentaram impedi-lo, mas ele os matou um por um, sua própria tripulação! Agora, por causa desse fracasso... Eles... Eles...

Lágrimas. Lágrimas começaram a se formar nos seus olhos junto a soluços. Aproximei e me ajoelhei em sua frente, ainda tomando um pouco de cuidado com a perna que eu feri agora pouco. Ele provavelmente não tem ligações com aqueles Animus, mas mesmo assim consegue derramar lágrimas por eles. Isso é um tanto quanto... Nostálgico, embora eu não saiba a razão.Encarei ele por um momento e tentei tocar sua cabeça, mas nada.

- É doloroso, não é? ...Fica calmo. As coisas vão melhorar em breve.

Ele enxugava os olhos com ambas as mãos enquanto tentava se acalmar.

- Isso é pelo gigante arrependimento que eles têm, certo? – Prossegui tentando acalmá-lo – Se as coisas se resolverem, isso trará fim a dor daqueles Animus, não concorda?

Um sorriso se esboçou em seu rosto enquanto seus olhos começavam a secar. Ele acenou positivamente com a cabeça.

- Ótimo, então deixe isso comigo... E os meus amigos. Não precisa se preocupar tanto com a gente, somos beeeem fortes!

- Tem certeza? Você está machucado demais para ser forte assim...

Ei... Outra vez?

- Foi um caso a parte. Mas me diz ai... Levando em consideração tudo o que houve, eles parecem ter fracassado. Então Lenarth realmente conseguiu invocar o que queria?

- Aham... O nome dele é Akem Manah. Eu nunca tive coragem de chegar muito perto, mas ele parece viver em uma caverna naquela direção – ele apontou para onde segui todo este tempo. – Nenhum de nós teve.

- “Nós”? Têm outros como você?

- Ué, você não viu ainda?

Não... Não era preciso pedir explicações a respeito disso. Eu estava distraído, mas agora que me foquei, eu realmente posso ver. Uma enorme multidão de Animus caminhando lado a lado, distantes mas ainda ali, murmurando coisas que eu não conseguia entender. Todos em direções diferentes, se atravessando sem notarem a própria presença.
Meu queixo caiu de tanta surpresa. Havia tantos todo este tempo? Seriam todos... Ecos?

- Eles não são ecos. É diferente. Acontece que... Tem alguém que não os deixa descansar.

Acorrentar almas neste mundo dessa forma não é certamente algo que um humano poderia fazer. Nem mesmo um necromante. Então;

- O tal do Akem Manah? – Chutei.

Ele concordou com a cabeça. De fato, não tem outro jeito.
Projetei uma faca em minha mão direita. Eu preciso guardar energia daqui para frente, mas acho que algo tão pequeno não vai me atrapalhar tanto.

- E... – me inclinei e comecei a desenhar no tronco da árvore com a faca enquanto os Animas circulavam pela área – Por curiosidade, estamos mais próximos da cidade ou da caverna?

- Da caverna, eu acho... Ei, o que é que você ta desenhando?

- Não é nada de importante.

Terminado o desenho, me afastei e fui para outra árvore na direção da caverna e comecei a desenhar algo parecido em seu tronco, enquanto isso, o Anima admirava o anterior. Um boneco palito, descabelado, apontando na direção da caverna enquanto segurava uma espada em posição de batalha. Eu tenho certeza de que eles vão entender o recado. Talvez eu deva desenhar o tal do Akem Manah em uma destas árvores. Mas não faço idéia de como ele seja. Um boi com chifres deve ser o suficiente. Espera, isso não é um touro?! O demônio é um touro?! Tudo bem, talvez se eu mudar o desenho na próxima árvore... Sim, agora, ele ficará sob duas patas e... Um dragão sem asas?! Uma hora eu acerto.

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